Preparando um café para Tim Wendelboe

Muitos de nós, baristas sedentos por novas experiências, já passaram pela situação de 'tietar' grandes campeões mundiais e mestres no preparo de café. Quando um barista-mortal se depara com uma celebridade barística, geralmente isso acontece em grandes eventos, cheios de barulho, gente chata interrompendo e o figurão com cara de inacessível e vontade de sair correndo.

Nunca vi nenhuma dessas celebridades fazendo turismo em BH. Mas meus amigos, não é que em Machado, singela e tímida cidade no Sul de Minas (não se esquecendo, grande produtora de café e centro da pesquisa e ensino na área de cafeicultura), vem Tim Wendelboe bater à minha porta.

Eu explico. Em julho, mês passado, os amigos Junior e Luciana inauguraram a corretora Legender em Machado, um espaço diferente das corretoras da cidade. Com foco em cafés de alta qualidade e realmente dispostos a contribuir para desenvolver uma nova percepção junto aos cafeicultores da região, a Legender trouxe Tim Wendelboe, campeão mundial de barista (2004), mestre de torra e caçador de cafés. Tim estava no Brasil conhecendo diversos produtores em São Paulo e Minas Gerais, buscando cafés excepcionais para comercializar em sua torrefação, e investigando profundamente a cultura do café nas regiões que visitou.

Encontramos Tim na Fazenda Recanto, da Maria Selma e do Afrânio. Maria Selma, que já conheço faz tempo, especulava comigo sobre quem seria essa visita surpresa de cujo nome ela não se lembrava. "Helga, joga na internet aí e descobre pra mim quem vem. Vem almoçar conosco e me descobre quem é esse campeão de barista que vem aí." Convenhamos, campeão tem todo ano, e pelo menos cinco, fora as modalidades que o WCE (World Coffee Events) deve ter inventado ultimamente que ainda não estou sabendo. Eu não fazia ideia de quem era esse cara misterioso. E então, eis que chega o Professor Leandro do IFSULDEMINAS no seu adorado jipe. Sinal de que a visita tinha pompa. E vem a equipe da Legender trazendo ninguém menos que o Tim.

Bom, o fato é que percorremos terreiros, tulhas, beneficiamento. Na EPAMIG, o Gilmar mostrou as principais cultivares em estudo para a região. Nas corretoras, uma verdadeira aula de cupping, e vários cafés nos surpreenderam. A visita de Tim aos produtores da região serviu para que eles vislumbrassem uma grande possibilidade em suas mãos: cafés diferenciados e com canal direto de venda. No final de uma safra desestimulante pela chuva e pela fermentação generalizada, renovou a perseverança do produtor.

No IFSULDEMINAS, mostramos nosso trabalho de capacitação em barismo, os laboratórios e a torrefação que atende aos pequenos produtores. E chegou o grande momento em que o Leandro oferece um espresso.

Eu gelei. Imagine a cena: recém voltados das férias, nenhum café descansado (aliás, torrado só uma amostra de 0,5kg), máquinas desligadas e Tim Wendelboe na minha frente esperando um espresso. Minha amiga topa-tudo, Tamara, câmera em punho para filmar o vexame. Mais pressão que campeonato de barista: regular moinho, falar inglês e servir um dos maiores baristas de todos os tempos. Moleza.

Só Leandro tinha torrado um café realmente especial. Era um dos cafés finalistas do Concurso de Poços de Caldas, o que tinha levado 5o lugar, mas que eu tinha gostado muito mais que o primeiro. E veio o veredicto: "Nossa, bem doce. Com acidez equilibrada, muito bom". Eu sabia que esse café frutado, nossa máquina, moinho (e minha mão) não me decepcionariam (sensação de alívio). Ao contrário da maioria dos amantes de espresso que passam por aqui, Tim não toma ristrettos, mas espressos de 1 onça, tradicionais (tradicionais para os europeus, é bom observar).

Valeu a pena parar a vida para estar dois dias com esse grande profissional. Tim seguiu sua viagem caçando cafés excepcionais. E a região de Machado segue a sua, buscando ser o destino de outro comprador excepcional.

Matéria do IFSULDEMINAS