Esse mês, setembro, eu completei um ano como barista. Extraí alguns espressos, rodei muito leite (bom e ruim), perdi noites de sono inventando drinques de assinatura, conheci muita gente bacana (e gente nem tão bacana), quebrei a cara, quebrei a french press alheia, quase abandonei a monografia, gastei dinheiro que eu não tinha, peguei coisas emprestadas que ainda não devolvi (mas eu vou, prometo!), resolvi comprar a briga por escolhas que nem sei se vão pra frente.
Eu descobri que nesse meio Barista tem gente que mata pra não morrer. Mas descobri também que umas boas surpresas podem salvar a sua pele e reanimar a fé na coletividade.
Uma delas foi o que aconteceu comigo no Campeonato Brasileiro de Coffee in Good Spirits. A única competição que eu tinha assistido e participado tinha sido a regional mineira em 2009 (inclusive, foi nessa ocasião que eu entendi quanta coisa dá pra fazer nos 25 segundos de um shot e que dois segundos bastam pra você ter vontade de arremessar o tamper na cabeça do primeiro que vier te consolar porque você estourou o tempo). No Good Spirits eu tremia igual vara verde. Não sei se era o nervosismo ou a dieta saudável de uma semana à base de café e pastel do Mercadão, mas eu estava bem descontrolada.
Uma barista aqui de BH tinha me emprestado uma french press, com a recomendação de que eu cuidasse muito bem dela. Eu sabia que a minha cabeça ia rolar se eu quebrasse a bendita cafeteira, então levei em bastante plástico bolha e não saí de perto dela até na hora de me preparar pra apresentação. De repente me mandaram para a máquina (“30 minutos para entrar!”). Eu, claro, entrei em pânico e taquei o café no moinho. E lá estou eu, regulando moinho, tirando um espresso, medindo ingredientes... “Cadê o pincel?” “Ah, ta aqui o pincel.” Um barulho de coisa quebrando, todo mundo parou o que estava fazendo e de repente eu vi a french press e a minha apresentação espatifando no chão.
“Você tem outra de reserva, né?” “Não, eu não tenho outra de reserva.” O que eu tinha era quinze minutos pra me virar resolver o que eu ia fazer pra não ser desclassificada. “Eu te empresto a minha!” “Mas não dá! Você compete comigo ao mesmo tempo!” Nessas horas a gente amaldiçoa todas as gerações de quem inventou que tinham que competir dois baristas ao mesmo tempo. “Calma, calma, a gente vai ligar pra cafeteria e arrumar uma emprestada pra você...”
De repente, todo mundo estava se mobilizando pra conseguir uma french press pra “menina de Belo Horizonte que tinha acabado de quebrar a french e ia competir em dez minutos”. “Já decidi, vou fazer espresso americano, vai ficar horrível mas tudo bem, o que eu não posso é não me apresentar depois do trabalho que deu chegar aqui.” A essa altura a Dani Capuano, dona da french press, já tinha aparecido e quase tido um filho roxo pela notícia. “Mas tudo bem, eu faço espresso americano. Eu faço espresso americano...”
Engraçado era que ninguém chamava os competidores. A última coisa que dava pra fazer era sair e comprar outra cafeteira. Ainda bem que a minha roupa era preta, porque eu jogava pó de café pra todo lado. Ainda bem que eu não estava de maquiagem, porque meu rosto já tava todo vermelho de tanto que eu chorava. Ainda bem que eu não me preocupei com as taças de cristal do drinque, que ficaram bem longe de mim o tempo todo e, por isso, continuam inteirinhas mesmo depois de voltarem a BH.
Mas eu ia fazer espresso americano. Decidido. Tinha um competidor que não tinha chegado ainda, já estava sendo dado por desclassificado. A competição tinha atrasado e a essa altura eu tinha ligado o “fuck it” e organizava minhas coisas pra entrar. E aí apareceu o competidor atrasado.
Apareceu o competidor com duas caixinhas de french press. Uma pra mim. “Mas quem comprou? Quem pagou? Pra quem eu pago? Pra quem eu devolvo?” “Esquenta com isso não. Vai lá e se apresenta.”
Eu fui, me apresentei. Sem espresso americano. Sem cara de choro, porque depois que a french chegou eu ainda esperei mais de uma hora pra me apresentar. É esse tipo de coisa que faz a gente acreditar nas pessoas. E participar do Good Spirits junto com o Nêgo, o Marco, o Jackson, o Bira, a Mariana e o Alex, me ensinou muito sobre trabalho duro, companheirismo, entusiasmo, paixão e tudo mais que o café e o barismo ainda podem me dar.
Eu soube depois que cafeteiras francesas não duram muito na mão de mineiros. A Michelle (Tameirão) me lamentou esses dias que quebrou a dela, o Urjel do Aleph Café também deu sumiço em uma e a Rosa Gabriela (barista de Três Pontas) outro dia estava me contando uma história quase tão dramática quanto a minha. Mas a french press que eu ganhei, que eu não sei quem comprou, não sei quem pagou e ninguém me deixou devolver, continua linda e inteirinha, guardada do lado das tacinhas de cristal e do pincel. O bendito do pincel.
Eu descobri que nesse meio Barista tem gente que mata pra não morrer. Mas descobri também que umas boas surpresas podem salvar a sua pele e reanimar a fé na coletividade.
Uma delas foi o que aconteceu comigo no Campeonato Brasileiro de Coffee in Good Spirits. A única competição que eu tinha assistido e participado tinha sido a regional mineira em 2009 (inclusive, foi nessa ocasião que eu entendi quanta coisa dá pra fazer nos 25 segundos de um shot e que dois segundos bastam pra você ter vontade de arremessar o tamper na cabeça do primeiro que vier te consolar porque você estourou o tempo). No Good Spirits eu tremia igual vara verde. Não sei se era o nervosismo ou a dieta saudável de uma semana à base de café e pastel do Mercadão, mas eu estava bem descontrolada.
Uma barista aqui de BH tinha me emprestado uma french press, com a recomendação de que eu cuidasse muito bem dela. Eu sabia que a minha cabeça ia rolar se eu quebrasse a bendita cafeteira, então levei em bastante plástico bolha e não saí de perto dela até na hora de me preparar pra apresentação. De repente me mandaram para a máquina (“30 minutos para entrar!”). Eu, claro, entrei em pânico e taquei o café no moinho. E lá estou eu, regulando moinho, tirando um espresso, medindo ingredientes... “Cadê o pincel?” “Ah, ta aqui o pincel.” Um barulho de coisa quebrando, todo mundo parou o que estava fazendo e de repente eu vi a french press e a minha apresentação espatifando no chão.
“Você tem outra de reserva, né?” “Não, eu não tenho outra de reserva.” O que eu tinha era quinze minutos pra me virar resolver o que eu ia fazer pra não ser desclassificada. “Eu te empresto a minha!” “Mas não dá! Você compete comigo ao mesmo tempo!” Nessas horas a gente amaldiçoa todas as gerações de quem inventou que tinham que competir dois baristas ao mesmo tempo. “Calma, calma, a gente vai ligar pra cafeteria e arrumar uma emprestada pra você...”
De repente, todo mundo estava se mobilizando pra conseguir uma french press pra “menina de Belo Horizonte que tinha acabado de quebrar a french e ia competir em dez minutos”. “Já decidi, vou fazer espresso americano, vai ficar horrível mas tudo bem, o que eu não posso é não me apresentar depois do trabalho que deu chegar aqui.” A essa altura a Dani Capuano, dona da french press, já tinha aparecido e quase tido um filho roxo pela notícia. “Mas tudo bem, eu faço espresso americano. Eu faço espresso americano...”
Engraçado era que ninguém chamava os competidores. A última coisa que dava pra fazer era sair e comprar outra cafeteira. Ainda bem que a minha roupa era preta, porque eu jogava pó de café pra todo lado. Ainda bem que eu não estava de maquiagem, porque meu rosto já tava todo vermelho de tanto que eu chorava. Ainda bem que eu não me preocupei com as taças de cristal do drinque, que ficaram bem longe de mim o tempo todo e, por isso, continuam inteirinhas mesmo depois de voltarem a BH.
Mas eu ia fazer espresso americano. Decidido. Tinha um competidor que não tinha chegado ainda, já estava sendo dado por desclassificado. A competição tinha atrasado e a essa altura eu tinha ligado o “fuck it” e organizava minhas coisas pra entrar. E aí apareceu o competidor atrasado.
Apareceu o competidor com duas caixinhas de french press. Uma pra mim. “Mas quem comprou? Quem pagou? Pra quem eu pago? Pra quem eu devolvo?” “Esquenta com isso não. Vai lá e se apresenta.”
Eu fui, me apresentei. Sem espresso americano. Sem cara de choro, porque depois que a french chegou eu ainda esperei mais de uma hora pra me apresentar. É esse tipo de coisa que faz a gente acreditar nas pessoas. E participar do Good Spirits junto com o Nêgo, o Marco, o Jackson, o Bira, a Mariana e o Alex, me ensinou muito sobre trabalho duro, companheirismo, entusiasmo, paixão e tudo mais que o café e o barismo ainda podem me dar.
Eu soube depois que cafeteiras francesas não duram muito na mão de mineiros. A Michelle (Tameirão) me lamentou esses dias que quebrou a dela, o Urjel do Aleph Café também deu sumiço em uma e a Rosa Gabriela (barista de Três Pontas) outro dia estava me contando uma história quase tão dramática quanto a minha. Mas a french press que eu ganhei, que eu não sei quem comprou, não sei quem pagou e ninguém me deixou devolver, continua linda e inteirinha, guardada do lado das tacinhas de cristal e do pincel. O bendito do pincel.
Adorei, Helguita!
ResponderExcluirse não vc não tivesse estimulado meu lado coffee freak mandava largar tudo e virar jornalista hehehe... escreveu muito bem, adorei : )
ResponderExcluirMuito bom!!!Gostei bem deste!! E, por um acaso, esta foi aquela french press de ouro que vc quebrou???? ;)
ResponderExcluirHehehe .. muito bom mesmo !!!
ResponderExcluirparecia que estava dentro da sua história .. hehe muito legal msm
bjos
Uau!!!muito bem escrito mesmo. Parabéns!Concordo com o comentário acima citado..." deveria ser jornalista"...show!!!
ResponderExcluirNossa... ainda bem que conseguio uma
ResponderExcluirFrench, campeonato deve ser tudo de bom.
Mais a auto-pressão é bem difícil de controlar.
Maravilhosa em tudo o que faz! Como sempre.
ResponderExcluirHistória divertidíssima e animadora, não só para baristas (já que eu não sou), mas pra todo mundo que teima em acreditar que ainda existe gente bacana por aí.
ResponderExcluirMuito bom!
Obrigada pelo incentivo, pessoal.
ResponderExcluirE sim, eu teimo em acreditar que existe muita gente bacana por aí! :)
Aí, garota!
ResponderExcluirEsta você!
Não desiste, persiste.
Seus caminhos estão abertos.
"Que eu fiquei agoniada, fiquei. Vivi cada momento com você."
Beijos.
Cristina.
Helga, seus textos estão muito bons, de verdade. Tô gostando de ver! Gui
ResponderExcluirQue orgulho... Viajei em suas palavras!! Além de uma redação bela, a lição extraída de sua vivencia não nos deixa "desistir" do Ser Humano!
ResponderExcluirBeijos minha querida e amada prima!
Su!